domingo, 12 de setembro de 2010

Crianças e os hábitos

Para se construir uma base sólida, precisamos de bons materiais e bons pedreiros.
Lembre-se sempre que, a mente de uma criança é como uma folha de papel em branco, na qual podemos escrever qualquer coisa.

Nessa folha em branco, que é a sua mente, que logo se transformará em sua personalidade, identificando-o como um indivíduo que pensa e age dentro da sociedade, podemos gravar todos os tipos de comportamentos.

A criança aprende através da imitação, isto quer dizer que, vendo o exemplo dos outros, sejam hábitos ou gestos simples como pegar e segurar objetos, ela acabará por se tornar um "hábil" qualquer coisa.

Seus medos e preferências, também elas apreendem, assimilam na íntegra a partir do exemplo, do modelo que lhes transmitem os adultos, que somos nós.


É importante frisar que, primeiro, as crianças tendem a imitar os comportamentos daquelas pessoas que ela admira, ou confia, como os pais, irmãos mais velhos, parentes com os quais possua mais afinidade.

Os vícios, as manias e os hábitos que detestamos, ou atitudes não éticas, tudo isso, são exemplos que os adultos transmitem para aquela folha em branco, onde podemos escrever qualquer coisa.

Não subestime a capacidade de assimilar coisas de uma criança. Seus sentidos são extremamente mais apurados que de qualquer adulto. É uma estratégia de sobrevivência da natureza, uma vez que nessa faixa etária ela precisa assimilar rapidamente todas as manobras que a permitirão sobreviver em seu mundo.


Ela apreenderá absolutamente tudo, sem códigos de éticas ou culpas presentes, pois sendo uma folha em branco, terá como única opção imitar aqueles que estão à sua volta, com seus exemplos de conduta, repetindo seus gestos, preferências, manias, vícios e hábitos, por mais bizarros que possam parecer. Como não tem discernimento, ou senso moral, ou culpas, apenas tendem a imitar, reproduzir aquilo que seus sentidos conseguem captar, seja o que for.

Desse modo, ela também aprenderá a odiar e gostar, a preferir e desprezar, a ser moralmente fraca ou forte, a ser corajosa para enfrentar os obstáculos da vida, ou o seu oposto.


Também aprendemos a brigar pelos nossos pontos de vista, mesmo quando se trata de coisa sem valor.




E finalmente, lembre-se, uma criança ao nascer, já adentra num mundo repleto de comportamentos milenares, de todos os tipos de códigos e símbolos, de infinitas personalidades que se antagonizam entre si em busca de espaço. Ali encontrará hábitos e manias que se repetem numa cadeia sem fim, passando de pai para filho, de individuo para individuo, e ela, a criança, certamente, também acabará por se tornar um desses personagens, ou uma mistura de todos. Reformatar, reprogramar esse personagem, nutrir essa nova mente, para que não repita os velhos e nocivos hábitos é papel do Educador ou Pai.




Uma criança não aprende um vício sem uma fonte de referência, um modelo que lhe sirva de orientação. Isto é, um vício não nasce como predisposição de berço, ou fatalidade genética como muitos nos querem fazer crer, isto lhe será ensinado.

Sobre as predisposições genéticas, não devemos confundir a herança de um código físico, com disposições psicológicas. O corpo físico pode padecer de uma predisposição para o desenvolvimento de uma doença, uma mente nasce vazia, dotada apenas de instinto, sem disposições ou preferências para uma coisa ou outra.


Uma doença nós não aprendemos, uma doença se desenvolve naturalmente, desde que as condições físicas necessárias à sua manifestação, e permanência, estejam presentes naquele veículo ou individuo. A mesma verdade não vale para os aspectos psicológicos da mente. Ali não há predisposição para uma ou outra patologia física, exceto as deficiências do próprio cérebro, mas apenas uma predisposição inata para assimilar qualquer comportamento já existente lá fora, qualquer um.

Do mesmo modo, não aprende uma coisa sem uma fonte, um modelo que lhe sirva de guia, isso inclui um padrão moral e ético que resolva adotar para si. Não a ética do educador, do tio ou pai, ou do personagem da moda, ou daquele que a história elegeu como uma referência que todos deveriam imitar, seja qual for, ela apreenderá um, ou vários, e daí finalmente nascerá o indivíduo no qual ela se tornará.

Sabendo disso, o educador ou o pai, deve fazer o possível, talvez ir além do possível, para que ela não se torne mais um autômato, um mero repetidor de coisas antigas, por mais sagradas que pareçam ser essas coisas aos nossos olhos. Lembre-se, tudo isso já foi tentado, repetido, herdado por nós, e eis o resultado que podemos ver em nossos dias.

Os nossos medos elas também herdarão, a menos que, não lhes ensinemos isso. Lembre-se, o medo se aprende, se pratica, se transforma em dezenas de outros medos. Não existe medo se não existem indivíduos medrosos, que ensinam aos outros os seus medos, e assim, os recém chegados aprendem aquilo que os outros já praticavam antes.


Se temos problemas, sociais, de convívio, de preferência com isso ou aquilo, existenciais e tantos outros, elas, as crianças, nossos filhos, não precisarão herdar isso de nós. É tudo uma questão de boa vontade. O que vamos ensinar aos nossos filhos? Será que desejamos para elas os mesmos problemas e limitações psicológicas que já temos, ou desejamos que cresçam livres de tudo isso?

E o que é ser livre? Será que o sabemos? Como podemos ensinar alguém a ser livre se sequer sabemos que coisa é essa? Assim, não deveríamos começar por tentar descobrir, por nós mesmos, o que vem a ser um ente livre para depois ensinarmos? Ser livre é repetir ao nosso comando, que é nossa vontade, os velhos e antigos esquemas e padrões de conduta que já seguimos? Falando nisso, afinal, de onde vem a nossa vontade, senão dos mesmos e velhos padrões, que já programaram, subjugaram, domesticaram a nossa mente?


Quando damos a devida atenção a uma criança, um mundo novo estamos construindo...




Como podemos ser livres, se ao longo de toda nossa existência apenas repetimos, e repetimos, velhas fórmulas, as milenares preferências e todo um modo de pensar? Não agimos de conformidade com aquilo que disse uma ou outra autoridade, seja ela sagrada ou profana? Em nossos dias, é diferente para nós daquilo que já foi para nossos pais e avós? Do mesmo modo que é importante nos aperfeiçoarmos como profissionais, não seria de igual, ou maior importância, aprendermos, sobre nossos medos, angústias, conflitos e causas do sofrimento humano. Poderíamos ir mais além, e eliminar tudo isso, do nosso existir.

Para ensinar liberdade, não aquela que significa sair de trás de grades ou portas fechadas, mas liberdade para pensar, para não repetir apenas porque a tradição o exige, em primeiro lugar precisamos descobrir, por nós mesmos, o que significa essa liberdade. Assim como, descobrirmos se há algum benefício, para nós, como seres humanos, em sermos livres. Isso nos dará a necessária força e motivação, para ajudar a criar uma mente livre, em nossos filhos ou alunos. Ser livre significa não sofrer, não imitar por força do medo, erradicar de vez de nossas vidas a violência.

E finalmente, também já fomos uma criança. E se agora, olharmos para trás, será que somos diferentes do pensamento do mundo, do mesmo mundo que nos formatou como indivíduos, que nos faz pensar como ele pensa? Existe um mundo psicológico sem as pessoas? Se não existe, nós em conjunto, toda humanidade junta, o que quer dizer, seu inteiro modo de pensar, somos esse mundo. A continuar sem mudanças, poderá ser diferente para nossos filhos?

Lembre-se, um hábito pode ser nocivo ou saudável. Se é capaz de tornar-se uma dependência, jamais poderá ser coisa saudável, mesmo que num primeiro momento seja capaz de proporcionar alguma satisfação, ou alegria.

Um hábito saudável, o deve ser pelo prazer de ser vivenciado, como o que sentimos ao ouvir uma boa música, ou um bom conselho, e nunca pela necessidade ou obrigação de qualquer natureza. Depender de elogios ou méritos pode se tornar um hábito de conseqüências devastadoras para o futuro adulto.

O dependente de elogios o será também de atenção, de ser o preferido, de ser sempre o centro das atenções. Será um critico sem procedência, isto é, sem causa, e tenderá a condenar qualquer opinião que não seja a sua, qualquer obra que não tenha o seu toque. Diante deles, todos serão sempre secundários, meros coadjuvantes dos seus anseios. Os ditadores possuem esse perfil.


Condenar uma criança por um erro cometido, especialmente diante dos seus colegas, é o mesmo que sentenciar aquele futuro adulto à dependência completa de aprovação, ou insegurança psicológica, o que significa dizer, alguém violento, com dificuldade de ter relacionamentos duradouros.

Um erro deve ser tratado como uma tentativa de acerto, ou uma maneira inadequada de se fazer uma coisa da forma correta. Não pode ser considerado um erro, uma falha por falta de habilidade ou de experiência, o que difere grandemente daquela criança que pratica alguma coisa sabidamente errada por exibicionismo induzido, de forma calculada.


Trata-se um erro com a devida consideração e empatia de alguém que também já os cometeu aos milhares, esse alguém, que somos nós, os educadores ou pais. Leva-se então em conta a falta de maturidade da criança, e essa experiência, quer dizer, o modo como trataremos esse erro, pode se tornar coisa má ou boa em sua mente, a depender de como responderemos a isso.

Um adulto inseguro e sem motivação, ou outro motivado e sempre disposto a recomeçar, eis o resultado que virá a partir da nossa resposta ao problema.


A construção de uma criança, assemelha-se ao erguer de uma casa, cuja solidez, dependerá da qualidade do seu alicerce.




Uma criança, por ser sensível ao extremo, deve ser tratada com o devido zelo, como alguém que ainda não sabe, mas que poderá estar disposta a aprender, e isso dependerá do modo interpretamos aquele ato, e como reagirmos. Se formos inquietos e intolerantes, elas assimilarão isso, e isso também será o seu futuro, e como adultos, repassarão para os filhos, e o ciclo recomeçará, ou simplesmente continuará.

Se as tratarmos com paciência e compreensão, também teremos crianças compreensíveis, tolerantes, sempre dispostas a nos ouvir, a nos procurar nos momentos de suas aflições, sejam elas de qualquer natureza.

E finalmente, lembre-se, criança não é um adulto de pequeno porte. Não é o "ser" criança uma simples questão de expressão corporal, acompanhada de voz infantil, ou o gostar de brinquedos, ou de objetos coloridos que façam barulho. Tudo isso são formas, que os adultos teimam em caracterizar, como o padrão que expressa uma criança. Ser criança é um estado existencial, que não pode ser simulado, nem criado de forma artificial, baseada nas aparências, assim como julgam os estúpidos, de mente estreita, que definem o "ser inteligente" como o saber imitar, como já fazem os papagaios, ao repetirem as palavras dos homens, mesmo sem saber o que estão falando.

Claro que em nosso mundo não podemos viver sem escolher. Isso não é possível, ao menos por enquanto, uma vez que todo mecanismo do nosso viver, se baseia na escolha. Logo quando abrimos nossos olhos, pela manhã, ainda na cama, temos de escolher, a hora de acordar, o planejar do nosso dia, se permaneceremos ou não na cama, e assim por diante.

O modo como lidamos com nossas escolhas, isso, também passaremos para nossos filhos. Não se trata de um processo explicito, como, por exemplo, numa sala de aula, onde todos se sentam diante do professor para ouvir, suas preleções diárias. Em nossa rotina de casa, nosso comportamento diante das várias circunstâncias, esta é nossa lição para eles, uma coisa informal e involuntária, porque quase nunca estamos atentos aos nossos atos. E eis o primeiro problema; raramente estamos atentos.


Como estamos sempre ocupados, com nossas próprias preocupações e afazeres, e quase nunca atentos ao que falamos e fazemos, devemos ao menos ensinar para elas, para nossas crianças, que cada situação ou circunstância de vida, sempre tem dois lados. Uma questão tem sempre dois lados, que igualmente, devem ser analisados, considerados, antes de uma decisão, seja um simples escovar de dentes.

Por que precisam as crianças escovar os dentes após as refeições? Elas, suas crianças já estão cientes do por quê? Isso é um simples processo de escolha, que mais tarde se transformarão em escolhas mais complexas. Assim, desde cedo, elas precisam compreender isso, primeiro com as coisas simples, ficando claro que durante a vida inteira, terão sempre que escolher.

Isso inclui estar sempre disposto a ouvir. Ouvir é um processo de escolha, e escolhemos aquilo que nos interessa dar ouvidos. Dar ouvidos é o mesmo que ouvir, assimilar aquele algo que nos é transmitido por alguém. As crianças só nos darão ouvidos, se, também estivermos dispostos a escutá-las. Aqui não vale fingir, elas saberão se há ou não interesse de nossa parte.


Elas estarão dispostas a conversar se sentirem interesse de nossa parte, por aquilo que fazem. Não precisa ser uma atenção exagerada, basta um mínimo de atenção, algo como um elogio informal, sobre qualquer coisa que realizem. Um elogio é diferente de uma recompensa, ou um presente. Um elogio sincero, sem recompensas, sem presentes, para a criança, tem muito mais valor.





Se a vida é um processo contínuo de escolhas, perder e ganhar, dessas duas coisas opostas, não poderemos prescindir em nosso viver. Saber perder e saber ganhar, deveria ser, senão a mais importante, uma das mais valorosas lições de vida, que poderíamos deixar como herança edificante para um filho, ou aluno. Isso, ao contrário do que muitos pensam, se aprende.

Desse aprendizado, nascerá um adulto confiante, sensato, respeitador, justo, ou ao contrário, um fracassado, injusto, inseguro, e portanto, irritadiço, recluso, violento, como o são a maioria dos inseguros. Perder ou ganhar, se aprende, primeiramente em casa, diante de nossa atitude diária, a partir daquilo que sai de nossas bocas, nossos comentários, e finalmente, de nossas ações.

Os pais são, em primeira instância, para suas crianças, aquilo que dizem ser, e dessa promessa, elas aguardam ansiosas por uma comprovação. Perceba-se a felicidade em seus rostos, quando são capazes de constatar, pessoalmente, que seus pais falaram a verdade, isto é, que aquilo que disseram, foram capazes de cumprir. A frustração do não cumprimento, se assemelha, ao que sentimos quando nos sentimos traídos por um amigo, não por qualquer um, mas por um amigo.

Dessa frustração elas demoram, ou não conseguem, se livrar mais. Ficarão em dúvida sobre elas mesmas, se tornarão campo fértil para serem manipuladas por oportunistas, pelas más companhias. Tenderão a perder a confiança nos seus pais, ou educadores, e isso dificilmente pode ser revertido, e a confiança restaurada. Poderão até confiar, mas com ressalvas, o que não é confiança absoluta.




De nossa atitude diante de uma falha ou perda, também eles herdarão nosso comportamento, seja ele de fracasso ou persistência. O bom humor diante de um contratempo, este é um dos maiores presentes que podemos lhes dar como educação de valor. Um adulto que enfrenta seus problemas com bom humor, jamais agirá com insensatez, sob nenhuma circunstância. Ele sabe que perder faz parte do jogo, e que não se perde sempre, nem para sempre, por isso aprende com os contratempos, e ensina, mesmo sem o saber, bem humorado, para suas atentas crianças.


Mas, para que se tornem fortes diante dos problemas, primeiro temos que lhes mostrar, na prática, através do nosso próprio exemplo. Existe lição mais objetiva para uma criança, que ver o próprio pai, ou educador, mostrando para ela mesma, através de si mesmo, que aquela coisa sobre a qual lhe falou, é real? Ao dar um exemplo de atitude ética, ou postura diante de um problema, cumpra, para provar que aquilo é possível, que é coisa possível de ser feita.

Não se tratará mais de simples palavras, mais de palavras que foram confirmadas pelo exemplo, e isso, definitivamente, para elas, torna-se uma verdade incontestável, incorruptível, para o resto de suas vidas.

Por último, uma lamentação seguida de comentários degradantes, é uma excelente forma de criarmos uma criança negativa, pois ela encontrará mais exemplos desse tipo na rua, que os comentários edificantes. Por isso, devemos comentar as injúrias sofridas, ou problemas inevitáveis, sempre com uma dose de imparcialidade ou critica bem humorada. Isso criará nelas a certeza de que, um contratempo é apenas um dos lados da questão, que existe outro lado, e este pode ser, a saída.

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